Essa é uma grande questão da modernidade, atualmente, vivemos mais tempo e melhor, em compensação, surgiu um fato novo para o qual não estávamos preparados: temos que fazer muitas escolhas. Ter filhos, por exemplo, antes era destino, agora é escolha.
Hoje em dia os jovens são belos, cultos, profissionais, têm amigos, praticam esportes, viajam bastante, têm negócios próprios, trabalham e são muito admirados por isso.
Enquanto estão ocupados construindo a vida que têm, a questão filho não está em pauta, até que o assunto comece a ganhar relevância entre um casal.
Então como decidir com responsabilidade qual é o melhor momento?
A decisão de ter um filho obedece aos princípios clássicos da tomada de decisões. Quanto mais variáveis forem consideradas, maior a chance de a decisão ser acertada. Nesse caso, há três áreas que devem ser consultadas: a idade reprodutiva, a estabilidade da relação e o equilíbrio profissional e financeiro. Em síntese, dessa decisão tão importante participam os três elementos que constroem nosso ser: a biologia, a emoção e a razão.
Quanto à biologia, sabemos que a mulher tem uma idade reprodutiva ideal, que vai dos 18 aos 35 anos, com alguma variação de mulher para mulher. Antes ou após essa faixa aumentam os casos de infertilidade e de distúrbios genéticos. Ainda que haja inúmeros casos de mulheres que se tornaram mães após os 40, tiveram gravidez tranquila e filhos saudáveis, os especialistas recomendam engravidar antes, para ter a estatística a seu favor.
No que diz respeito ao lado emocional, é necessário dizer uma coisa dura: provavelmente, o maior dos erros que um casal pode cometer é o de achar que um filho vai trazer felicidade. O certo é trazer um filho para compartilhar a felicidade que já se tem. Até porque seria muito cruel e egoísta dar essa responsabilidade para o pequeno ser.
Concordo que um filho dá a sensação de plenitude, de continuidade, de imortalidade. Mas é necessário que ele encontre um mundo pronto para recebê-lo, estruturado o suficiente para lhe dar a chance de crescer de modo saudável e com uma personalidade estruturada.
Quanto à lógica, esta se refere ao lado prático da vida. Um filho dá despesa, exige espaço, tempo, atenção, não pensar no aspecto financeiro seria uma irresponsabilidade.
Planejamento familiar pode parecer diferente de outros planejamentos porque tem um fortíssimo componente emocional. Sim, tem amor envolvido na questão, mas continua sendo um planejamento.
Apesar do trabalho e da despesa, um filho é motivo de felicidade para o casal.
Sem dúvida é a maior felicidade que se pode experimentar, mas estamos diante de duas questões bem diferentes: a maternidade e a tomada de decisões. São dois assuntos que pertencem, em parte, a áreas diferentes da mente humana. A maternidade é uma força própria da condição de ser mulher, e a ela concorrem o instinto e a emoção, e a emoção de ser mãe, de amar da forma mais intensa possível, de se sentir amada, de ver nos olhinhos do filho o verdadeiro sentido da vida. A maternidade está, sim, entre as maravilhas de uma existência. Trata-se de uma experiência que nem sequer pode ser explicada, só pode ser vivenciada.
Ter um filho, vê-lo crescer, sorrir, aprender, errar, dar os primeiros passos em direção ao controle de sua vida. Mas há a decisão, e esta pertence ao círculo da lógica, ainda que faça parte das funções dela consultar as emoções, sem as quais as decisões se tornariam frias e estéreis. Pense um pouco: se decidir qual sapato comprar já causa uma revoada de borboletas no estômago, imagine o borboletário ao ter que decidir se está, ou não, na hora de ter um filho. Trata-se de uma decisão que irá mudar sua vida, não duvide disso. Aquele pequeno ser assume o comando de tudo à sua volta. Os horários da casa, a estrutura do quarto, os móveis da sala, tudo passa a girar em torno das necessidades e dos desejos do pequeno.
Não que ele não faça sua parte. Quando resolve brincar às 4 da manhã, tira você da cama de mau humor, mas este se desvanece na primeira risadinha que faz aparecer aquelas covinhas na bochecha. Ele tem tudo sob controle. Suas armas são a alegria, o riso, os pequenos movimentos, a descoberta de que tem mãozinhas, o aperto que dá em seu polegar demonstrando dependência e confiança.
Não basta o desejo de ter filhos? O que mais é preciso? É maravilhoso ter um filho, e será tão mais quanto mais agregar valor à nossa vida. A questão é que ele também tira algo, pois é um sugador insaciável de atenção, cuidados, tempo, dinheiro. Há um preço a pagar, e temos que estar preparados para isso. Se assim não for, a maravilha da maternidade, ou da paternidade, perde pontos para a aridez da vida prática.
Matéria por
Dr. João Paulo Scamardi Silvado
Pediatria CRM/SP 128.218 RQE 37727 | São José do Rio Preto