A presença dos pais (ou responsáveis) está marcada desde o princípio no trabalho de psicoterapia com crianças, ou seja, o manejo desta presença está imposto, afinal a demanda inicial de tratamento é primeiramente articulada pelos pais e a escuta destes se faz fundante, já que o sujeito não é inato, mas se constitui frente a inúmeras variáveis.
Por outro lado, a criança possui suas respostas singulares frente a suas vivências, devido a isso é que se faz possível um trabalho com essa faixa etária, ou seja, o desafio do profissional se dá ao considerar, simultaneamente, a importância do discurso dos pais sobre a criança, e as respostas da criança diante de sua própria posição.
Deste modo, não há padrões a serem impostos nesta clínica, pois o trabalho ocorre justamente na singularidade de cada sujeito e de cada sintoma apresentado, porém, ao se tratar de crianças é preciso oferecer uma escuta aos pais que não se restrinja a queixa dos sintomas de seus filhos, mas um espaço que possa ter efeitos sobre o lugar idealizado do filho que eles constroem, afinal o sintoma de uma criança representa uma quebra de ideal e a expectativa do tratamento psicológico é justamente resgatar este lugar idealizado.
Assim sendo, um trabalho exclusivamente voltado a queixa dos pais reduziria a criança a este parecer, não vislumbrando assim toda a complexidade de um ser em plena constituição psíquica. Ou seja, além de escutar o lugar que a criança ocupa no ideal dos pais, se faz necessário ir além e estar atento sobre o lugar no qual a criança é capturada no desejo dos mesmos, levando em consideração as especificidades dos laços que compõe a rede familiar.
É neste sentido que se faz indispensável situar o enlace entre pai, mãe e criança como funções e lugares, onde o manejo clínico do tratamento não seja desviado na crença de uma relação direta entre as atitudes dos pais e suas funções, mesmo quando os dados destas atitudes sejam extremamente relevantes. Isto é, evidentemente não se trata de descartar os efeitos das atitudes dos adultos responsáveis para com a criança, mas de escutar para além desta causa-consequência, no sentido de permitir a cada um dos envolvidos um reconhecimento de suas próprias posições.
Sendo assim, é na aposta do sujeito que se constitui na criança e na escuta do desejo que um filho(a) causa em seus pais, que um trabalho psicológico pode ser realizado, onde as transferências precisam ser analisadas, pois numa clínica com crianças a transferência precisa se estabelecer também com os adultos responsáveis, ou seja, assim como a criança, os pais precisam do mesmo modo se questionarem sobre suas posições, pois são pessoas encarnadas em funções fundamentais e indispensáveis para a constituição de um sujeito que ainda se encontra na condição infantil.
Matéria por
JULIANE OZELAME RIBAS MOHANA
Psicóloga CRP 08/15864 | Campo Mourão